quinta-feira, 14 de março de 2013

A INSANA JUSTIFICAÇÃO DA TORTURA

 

Ernst Janning: “Juiz Haywood ... eu pedi que viesse para lhe dizer...aquelas pessoas, milhões de pessoas ... eu não sabia que aquilo ia acontecer...acredite em mim, o senhor deve acreditar em mim!”

Juiz Dan Haywood: “Herr Janning, começou a acontecer na primeira vez em que o senhor sentenciou à morte um homem que sabia ser inocente”

 

 

(A partir de 6:00 min)

 

O diálogo da epígrafe é o final de Julgamento em Nuremberg, filme de 1961 de Stanley Kramer. Ernst Janning é o juiz condenado por crimes contra a humanidade porque aplicou as leis desumanas do III Reich. “Aquelas pessoas, milhões de pessoas” eram as vítimas do genocídio nazista. Dan Haywood, um dos juízes de Nuremberg. O filme foi livremente inspirado em fatos reais (o chamado “julgamento dos juízes” em Nuremberg, 1947). Já sentenciado, o criminoso nazista pede a visita do juiz porque quer, pelo menos, o seu respeito. Recebe essa dura condenação moral.

Na esfera pública ninguém é inimputável.

A barbárie nazista foi possível porque havia uma estrutura constituída por (aparentemente) insignificantes decisões burocráticas, atos de defensores da lei, ordens cumpridas cegamente e decisões de juízes aplicando leis patológicas que consideravam parte do povo como sub-humano. Foi possível porque havia um senso comum: opiniões, crenças e convicções "filosóficas".

Isto tudo vai constituindo o tecido social da convencionalidade: se “todo mundo” pensa e age assim, então está correto. Muitos dos que tinham juízo crítico suficiente para perceber a infâmia não possuíam a coragem moral para enfrentar a força da convencionalidade, o que quase sempre implica prejuízo aos próprios interesses.

O que o juiz de Nuremberg diz ao juiz aplicador das leis nazistas pode ser expresso mais ou menos da seguinte forma: “o senhor não estava em Auschwitz colocando gente em fornos crematórios, mas não pode alegar inocência. Suas sentenças, mesmo atingindo poucos indivíduos, violaram direitos básicos e reforçaram a convicção de que milhões de pessoas, por sua etnia, eram inferiores e não tinham o mesmo direito à vida que os demais.”

O psicanalista Contardo Caligaris publicou em sua coluna da Folha de São Paulo artigo em que aborda o tema da tortura a propósito do filme de Kathryn Bigelow, A Hora mais Escura. Se uma criança foi sequestrada, dizia ele, está em um lugar com pouco ar e você prendeu o sequestrador, que não diz a localização e não existe ainda o soro da verdade, o que você faz? Conclui que, sendo a tortura eficaz, pode ser moralmente justificável em certas ocasiões.

Na armadilha de Caligaris tercius non datur: ou somos torturadores ou somos assassinos de bebês. O paradoxo cerebrino nos condena de qualquer forma à iniquidade.

Vladimir Safatle respondeu na mesma Folha de São Paulo. Denunciou o “paradoxo moral de laboratório”, que pressupõe condições sobre as quais jamais poderá haver controle. O sujeito tem que saber algo sobre a bomba, não há hipótese de ter pego a pessoa errada, o torturado certamente falará antes de morrer, etc. (Safatle gostaria de saber que existe um processo em curso no foro criminal de São Paulo parecido com o dilema proposto por Caligaris. Uma pessoa foi torturada para dizer onde estava uma vítima de sequestro. Mas o torturado nada tinha a ver com o sequestro...). Safatle afirma que enunciar um paradoxo desses nunca pode ser considerado neutro. Quem nega o Holocausto não o faz desinteressadamente. A negação importa para a sua visão do mundo e tem consequências.

O jurista Pedro Estevam Serrano lamentou, em texto publicado na Carta Capital, que mesmo em sociedades democráticas o debate possa ser tomado por psicopatias, pela ausência de senso moral, pela admissão do que é tido como mal sem culpas ou vergonhas. Afirmou Serrano que dissociar a tortura como método investigativo do juízo moral a seu respeito é manifestação de uma racionalidade psicopática. Um tal debate implica criar âmbitos de aceitação da prática. Em outros termos, concede razoabilidade a prática que somente pode receber absoluta reprovação moral.

Marcelo Coelho, também na Folha, trouxe uma observação que tem a ver com o que Serrano denominou de “âmbito de aceitação da prática: “se eu começar a assistir a muitos filmes em que o herói é um torturador eficiente e simpático, também vou acreditar que a tortura funciona”.

Safatle, Serrano e Coelho, cada um a seu modo, reproduzem um dos sentidos implícitos na resposta do juiz de Nuremberg ao juiz do III Reich. Na esfera pública as coisas não se perdem e também não é verdade que verba volant. Cada conduta e cada palavra são irradiadas em alguma dimensão e não raro como os círculos concêntricos que se formam quando um objeto cai na água e o círculo seguinte é maior que o anterior. Uma engrenagem somente se move se cada uma de suas pequenas peças se movimenta na mesma direção: um artigo de um prestigiado psicanalista dizendo que a tortura, sendo funcional, pode ser legítima; um filme que mostra o policial justiceiro enfiando sacos de plástico na cabeça de criminosos; outro filme que diz às pessoas que o sórdido terrorista Bin Laden foi localizado graças aos afogamentos em Guantanamo. Sempre situações em que a tortura está do lado do "bem" e em que se joga para provocar empatia com o torturador.

A tortura torna-se, assim, com uma contribuição aqui, outra ali, senso comum para uma parte do universo social e ganha a força tremenda da convencionalidade. Para uma outra parte, desliza para uma mera questão de ponto de vista. Você pode ser a favor ou contra a tortura do mesmo modo como é, digamos, a favor ou contra o parlamentarismo. Um tortura para salvar bebês. Outro, como agente do Estado, para defender a sociedade dos criminosos. Comentaristas de internet, após ler o artigo de Caligaris, assistir Tropa de Elite ou o filme de Bigelow se veem legitimados para escrever pérolas como “bandido bom é bandido morto” e “direitos humanos são para humanos direitos”.

No lado mais sombrio disso, um fato da convencionalidade está pronto para ser capturado como “verdade”, como ocorreu na apropriação nazista do romantismo filosófico do volkisch de Fichte. O historiador Robert Gellately em Apoiando Hitler – Consentimento e Coerção na Alemanha Nazista mostra a aplicação do conceito de volkisch (aproximadamente “poder do povo”) no processo penal nazista. Todas as garantias iluministas de proteção do indivíduo e limitação da ação do Estado desapareceram. Um senso comum insano alimentado pelo establishment nazista foi elevado à condição de verdade moral e jurídica. A vontade e o que se alegava ser o interesse do povo passaram a ser os juízes absolutos do certo e do errado.

Este romantismo jusfilosófico não está exatamente longe de nós. Em trabalho inédito, Patrick Mariano transcreve voto do ex-ministro do STF Ayres Brito: “a decisão há de estar permeada de fatos ocorridos na sociedade. A expectativa social em torno da decisão judicial é um elemento a ser considerado. O juiz não pode decidir de costas para a sociedade”.

Caligaris fez uma tréplica aos seus críticos. Considero que seu primeiro texto recebeu as críticas necessárias e não me deteria nessa polêmica se a tréplica não contivesse distorções e graves problemas de informação. Afirmou então que as certezas morais são pueris e defendeu sua proposta de dilema invocando a autoridade de Lawrence Kohlberg, e com uma certa dose de arrogância observou: “sugestão: antes de falar de dilemas, ler as obras principais de Lawrence Kohlberg.”

Bem, eu leio Kohlberg há muitos anos. O problema da tréplica é que o Kohlberg que Caligaris apresenta ao leitor brasileiro é um que não existe. Mais do que distorcido, está invertido. Nada mais longe de Kohlberg do que dizer que as certezas morais são pueris.

Caligaris afirma que que tanto para ele quanto para Kohlberg “escolher pelo foro íntimo é sempre mais moral do que escolher por obediência a uma cartilha”. E adiante: “um sujeito concreto não tem os direitos humanos cravados no peito pelo dedo divino; se ele for contra a tortura, será porque seu pai foi torturado ou porque seu pai foi um torturador, porque seu colega do primário arrancava as asas das moscas (...) ou porque ele foi torturado pelo pai...”

Em síntese: as escolhas morais são relativas e subjetivas (“foro íntimo”) e suas causas decorrem de experiências pessoais. As escolhas morais são uma contingência da vida e nós outros, que reprovamos, por exemplo, a tortura, jamais o fazemos por uma visão de mundo autônoma, racional e por força de uma consciência livre.

Evidentemente Caligaris tem todo direito de defender esse ponto de vista. Mas nenhum direito de dizer que Kohlberg tem algo a ver com isso.

Lawrence Kohlberg foi um psicólogo americano, acadêmico e pesquisador do desenvolvimento moral. Seu trabalho teve enorme repercussão mas permanece ignorado por aqui. Habermas, por exemplo, dialogou com Kohlberg e utilizou sua pesquisa. Os pesquisadores que o conhecem no Brasil em geral tomam conhecimento de seu trabalho apenas por Habermas. Nenhuma de suas obras foi traduzida para o português. Uma busca no “dedalus” da USP mostra não existir em qualquer das bibliotecas da Universidade os dois livros básicos do pesquisador, The Philosophy of Moral Development e The Psicology of Moral Development, ainda que aparecendo em trabalhos esparsos como referência. Uma pena para nós.

Kohlberg fez pesquisas transculturais (EUA, América Central, Ásia, etc) e longitudinais (acompanhamento do mesmo indivíduo em momentos diferentes de sua vida). Ele e sua equipe entrevistavam as pessoas apresentando um dilema, que denominou de Dilema de Heinz. A mulher de Heinz (não o filho, como diz Caligaris) está com um tipo muito grave de câncer. Há uma droga que pode salvá-la, mas o farmacêutico cobra 10 vezes o preço real. Heinz pede dinheiro para as pessoas e consegue metade. O farmacêutico não aceita metade e nem permite que Heinz pague depois a outra parte. Desesperado, Heinz invade a farmácia e pega a droga.

Kohlberg perguntava às pessoas se Heinz agiu corretamente. Concluiu com base nas respostas que existia um padrão universal de desenvolvimento moral. Esse padrão se apresentava em três níveis, cada um deles dividido em dois estágios: nível pré-convencional (com estágio 1, orientação para a obediência e receio da punição e estágio 2, instrumental); nível convencional (estágio 3, orientação em face das relações intersubjetivas e estágio 4, orientação para a lei e ordem); nível pós-convencional (estágio 5, orientação para o contrato social e prioridade dos direitos e estágio 6, princípios éticos universais).

Kohlberg afirmava que o que caracteriza cada nível não é a regra concreta (apropriar-se da droga ou não), mas o modo de raciocinar.

No nível convencional, por exemplo, a pessoa usa juízos do tipo “as pessoas vão dizer que Heinz não gosta da mulher e pensar mal dele se não pegar a droga” ou “ele não deve roubar porque é contra a lei”.

No nível pós-convencional os juízos são diferentes. No estágio 5 não se considera a lei e a ordem, e o juízo pode ser do tipo “a mulher de Heinz tem direito à vida mesmo que a lei seja violada”; no estágio 6 raciocina-se de acordo com princípios éticos universais (regra de ouro, imperativo categórico, dignidade da pessoa humana). Este último é o estágio máximo de desenvolvimento moral.

Tanto no estágio mais baixo quanto no estágio mais avançado a pessoa pode responder que era certo pegar a droga, mas os motivos são diferentes. No estágio 1, se ela não vai sofrer consequências físicas, como a prisão, está certo invadir a farmácia; no estágio 6 está certo pelo valor da vida e pela dignidade humana.

Para maior clareza quanto ao último estágio vejamos o que diz Kohlberg: “o certo é definido por decisão da consciência de acordo com princípios acolhidos pelo sujeito em decorrência da abrangência lógica, universalidade e consistência. Esses princípios são abstratos e éticos (Regra de Ouro, imperativo categórico); eles não são regras concretas como os Dez Mandamentos. No fundo são os princípios universais de justiça, reciprocidade e igualdade dos direitos humanos, e de respeito pela dignidade dos seres humanos como indivíduos” (The Philosophy of Moral Development, p. 19).

Raras são as pessoas que atingem o estágio 6. O desenvolvimento se dá estágio por estágio, não há saltos e na grande maioria das vezes o indivíduo estaciona em um estágio igual ou inferior ao 5. Mas todos seriam capazes de atingir os estágios superiores porque esse desenvolvimento é uma estrutura da razão. O juízo não implica necessariamente a conduta correspondente, mas é requisito para ela.

Os dilemas podem ajudar a sofisticar os juízos morais dentro dessa estrutura, não aleatoriamente em função do “foro íntimo” ou das experiências de infância.

Não se trata, pois, para Kohlberg, de relativismo e subjetividade. As pessoas nos estágios máximos tem certezas morais, objetivas e universais, e essas certezas se expressam não por regras concretas, mas pela modo do juízo, de acordo com formas clássicas de moralidade: regra de ouro, imperativo categórico ou o valor absoluto da dignidade humana As regras concretas aparecem logicamente subordinadas à forma universal do juízo moral. A pessoa não conclui que torturar é errado porque alguém disse isso ou porque está nos Dez Mandamentos. Conclui que torturar é errado ou porque a dignidade humana é um valor universal, ou porque se coloca no lugar da pessoa, ou porque é seu dever como ser dotado de razão e consciência defender a vida e a integridade das pessoas. Não porque seu pai era torturador ou foi torturado ou porque seu amigo arrancava asas das moscas, como diz Caligaris.

Em síntese: o desenvolvimento da moralidade tem uma estrutura racional que culmina com princípios éticos universais.

Nenhum dos críticos de Caligaris caiu, claro, na armadilha de entrar no dilema, o que lhes conferiu o status da pós-convencionalidade de Kohlberg: recusaram a cilada porque ela conduziria ao fortalecimento de setores retrógrados da sociedade e contribuiria para enfraquecer o respeito à vida, à integridade física e psíquica dos seres humanos.

Afinal de contas, induzir as pessoas a dizer que torturariam em um país que ainda convive com as consequências da tortura praticada durante a ditadura militar, que convive com a tortura como um fato cotidiano das delegacias de polícia, em um tempo em que a maior potência do planeta incorpora ao seu ordenamento jurídico a possibilidade da tortura, serve a quem? Na verdade, pueril seria entrar no dilema proposto.

As pessoas que tem certezas morais, como a dignidade humana, não são tolas.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Morreu Ronald Dworkin






Dworkin deu uma contribuição decisiva para a Filosofia do Direito contemporânea em dois ensaios.





Nos Direitos a Sério, sustentou a legitimidade dos movimentos contestatórios do final dos anos 60, que a direita americana procurava desqualificar com o mito da "maioria silenciosa". Dworkin dizia que os direitos se exercem a despeito da maioria,  que sujeitos de direitos são as pessoas, e que era uma falácia  supor que há um sujeito de direitos chamado "maioria". 





Em O Modelo das Normas, Dworkin deu o arcabouço teórico adequado para fundamentar o mal-estar com o Positivismo após as tragédias humanitárias da primeira metade do século XX, como o holocausto. Percebeu o papel dos princípios, sua estrutura lógica  e a sua eficácia específica ao subordinar eticamente as regras, permitindo negar eficácia a elas, se o caso. Com isso, o Direito não deve ser visto como um conjunto de normas formais, como pretendiam os positivistas em sua neutralidade "científica", mas um conjunto de direitos.





RIP Ronald Dworkin


quinta-feira, 8 de novembro de 2012

ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA VOLUNTÁRIA (Alexandra Szafir)

 

Sabia de  Alexandra Sfazir por amigos comuns e li o seu ótimo livro de crônicas DesCasos. Agora nos tornamos amigos virtuais e temos trocado textos e crônicas. Posto este artigo dela,  humano, inteligente e sensível,  que mostra como funciona de verdade o Direito Penal.

 

Tortura_-_Pau_de_Arara_thumb

 

Living is easy with eyes closed, misunderstanding all you see”

The Beatles, Strawberry Fields Forever

Certamente, todos estão familiarizados com a história, amplamente divulgada pelos meios de comunicação, dos três jovens que passaram dois anos presos sob a acusação de terem estuprado e matado a ex-namorada de um deles. Com a prisão do “serial killer” que ficou conhecido como o maníaco de Guarulhos, este teria confessado a autoria do crime, com uma riqueza de detalhes que somente o verdadeiro assassino poderia conhecer, como, por exemplo, a roupa usada pela vítima quando foi morta, o fato de o corpo ter o rosto coberto por um véu, etc.

Os rapazes foram soltos, o Promotor de Justiça responsável pelo caso já avisou que pedirá a absolvição deles, o Secretário de Segurança Pública já anunciou que eles serão indenizados sem necessidade de processar o Estado e todos comemoram o final feliz, o desfazimento de uma gravíssima injustiça, que, felizmente, aconteceu antes de uma possível condenação dos réus inocentes pelo Tribunal do Júri.

Nesse clima, os jornais publicam entrevistas nas quais os jovens contam os horrores da prisão, incluindo-se aí bárbaras sessões de tortura, falam de seu medo de represálias, de planos para o futuro, dizem que são seres humanos e não lixo (e podemos apenas imaginar o tratamento dado a eles nos últimos anos, para que julgassem ser necessário fazer o esclarecimento de fato tão óbvio).

Lemos ainda a descrição da emocionante saída deles da prisão e de como eles foram recebidos com fogos de artifício no bairro onde moram. É o tipo de notícia que a maioria das pessoas não se cansa de ler.

No entanto, embora renda belas matérias jornalísticas (e é mesmo inegável o interesse humano da notícia), a saída deles da prisão é a parte menos importante da história, até porque esta saída se deu por mera casualidade, ou sorte (o verdadeiro culpado foi preso por outro motivo, não porque alguém tenha dado algum crédito aos protestos de inocência dos três e tenha resolvido investigar melhor o crime pelo qual eles foram presos e processados).

O que realmente importa, repita-se, não é como e por que eles saíram da cadeia, mas como e por que nela entraram e permaneceram por tanto tempo.

Aparentemente, a questão já foi respondida: toda a injustiça aconteceu por causa de maus policiais, que os torturaram e obrigaram a assinar falsas confissões, as quais, por sua vez, induziram o Promotor de Justiça e o Juiz a erro. Assim, a denúncia foi oferecida e recebida; as prisões cautelares, requeridas e decretadas; a sentença de pronúncia, prolatada; e, finalmente, o recurso dos réus, improvido, mantendo-se, é claro, a prisão.

Mas parece – e é – muito cômodo e fácil atribuir a culpa aos policiais torturadores, professar repulsa à tortura, e eximir de qualquer responsabilidade os nobres membros do Poder Judiciário e do Ministério Público, certamente acima de compactuar com tais condutas.

Todos parecem se esquecer de que o Juiz e o Promotor têm o dever de fiscalizar a legitimidade da atuação policial. Se alguém é torturado para confessar, espera-se que, finalmente, ao se ver no Fórum, diante de um Juiz de Direito e de um Promotor de Justiça, como num santuário, poderá falar livremente e ali encontrar guardiães dos direitos constitucionais garantidos no artigo 5º, que se indignarão, e descartarão a confissão forjada, além, é claro, de tomar todas as medidas possíveis para punir os criminosos(fardados ou não), deixando claro que não compactuam com seus “métodos de interrogatório”.

Se os três jovens alimentavam tais esperanças, deram com os burros n’água: se é verdade que, pela primeira vez, puderam falar livremente – e, segundo consta, de fato puderam, pois em entrevistas aos jornais, eles contam que a descrição minuciosa de todas as torturas por eles sofridas estão nos autos – por outro lado, não é menos exato que isso de nada lhes serviu, uma vez que aqueles que deveriam protegê-los de abusos, os tais “guardiães da legalidade”, não deram crédito algum às suas palavras: prova disso é que as prisões cautelares foram mantidas e a sentença de pronúncia, prolatada, como verdadeiras chancelas do “trabalho” policial.

Ainda assim, o sistema legal tem outra forma de corrigir possíveis equívocos: o duplo grau de jurisdição. A parte que se sentir injustiçada pode recorrer ao Tribunal de Justiça, onde, após um parecer da Procuradoria de Justiça, o caso é submetido a três Desembargadores, mais experientes que o juiz de primeira instância.

No caso em exame, também no Tribunal, ninguém viu nada de errado com a pronúncia e a prisão cautelar.

Diante de tais fatos, as perguntas que, mais do que não querer calar, berram para serem feitas, são perturbadoras:

•Onde falhou o sistema, para que as coisas chegassem tão longe, em se tratando de réus inocentes?

• Considerando: i) que o sistema é falho, e ii) como se realçou, os três só foram inocentados por mera casualidade, quantos inocentes que não tiveram a mesma sorte – de o verdadeiro culpado ser preso e confessar o crime – não estarão presos, provisoriamente ou condenados, pelo país afora?

• Se os rapazes fossem culpados, seria menos grave torturá-los para obter suas confissões?

Com relação à primeira questão, as declarações desastradas dadas aos jornais por algumas das autoridades envolvidas ajudam a descobrir a resposta. O Desembargador responsável pela Relatoria, por exemplo, insiste que manteria os rapazes presos e pronunciados, mesmo agora, diante dos fatos novos. Para defender sua posição, chega ao ponto de atribuir “notas”, numa escala de 0 a 10, para a necessidade da pronúncia e da prisão cautelar, de acordo com os elementos existentes nos autos.

Confrontado com o fato de outra pessoa ter confessado o crime com uma riqueza de detalhes que só o verdadeiro assassino poderia conhecer, o nobre Julgador não se abala. Seria de se esperar que ao menos ele admitisse a mera possibilidade de seus critérios para avaliar os elementos dos autos estarem errados, atribuindo a esses elementos força probante maior do que eles têm na verdade. A providência seria de fundamental importância para outros réus inocentes, os quais, ante a impossibilidade de descobrir o verdadeiro autor do crime do qual estão sendo acusados, ao menos saberiam que não têm a obrigação ou a necessidade de fazê-lo, pois poderiam ter a certeza de que só seriam presos/pronunciados/condenados se houvesse elementos idôneos para isso.

No entanto, ao invés de fazer esse exercício de auto-questionamento e humildade, saudável até mesmo para aqueles que, diferentemente dele, não são confrontados com a prova do desacerto de suas decisões, o Desembargador preferiu olhar para fora e questionar a idoneidade da prova do seu erro (coisa que nem o juiz e o promotor do caso fizeram).

Assim, ele lança dúvidas sobre a confissão do tal “maníaco”, afirmando não saber em que condições ela teria sido obtida e salientando que ele está confessando "por atacado" (como se a quantidade de crimes cometidos não fosse, por definição, característica essencial do serial killer).

Ainda assim, tais preocupações com as condições de obtenção da confissão são pertinentes e seriam até elogiáveis, não fosse pelo fato de elas não terem dado o menor sinal de vida no caso em que aquele que as manifestou tinha a obrigação de se preocupar: o dos três jovens que ele manteve presos. Como, até onde se sabe, neste caso Sua Excelência não fez qualquer reserva à confissão policial, embora os três tivessem dito expressamente nos autos que tinham sido torturados, essa súbita manifestação de dúvidas quanto à idoneidade da confissão do “maníaco” parece puro oportunismo. Em outras palavras, tal manifestação não parece ser fruto de uma preocupação genuína, mas da necessidade de ter argumentos para não admitir o próprio erro.

Embora o Promotor de Justiça e o Juiz de primeiro grau tenham tido a decência mínima de reconhecer que houve um erro grave, requerendo e determinando a soltura dos réus, é certo que se eles tivessem considerado a hipótese de que os rapazes pudessem estar falando a verdade, ao invés de confiarem cegamente no "trabalho" da polícia (para isso, convenha-se, não são necessários juízes ou promotores: poder-se-ia passar diretamente do relatório do inquérito policial ao julgamento pelo Tribunal do Júri), ou se ao menos não pedissem e decretassem prisões cautelares desnecessárias (ao que consta, ao menos um deles foi preso dentro de casa), a injustiça poderia ter sido sanada muito antes; mas, repita-se ainda uma vez, isso só ocorreu porque os réus tiveram a sorte de ser descoberto o verdadeiro autor do crime, ou correriam o sério risco de serem condenados no Tribunal do Júri, até porque quando o juiz e o Tribunal mantêm os réus presos, é natural que os jurados fiquem propensos a acreditar na periculosidade deles e, consequentemente, a condená-los (bem por isso, não é raro a acusação usar tal “argumento” ao pedir a condenação aos jurados).

A explicação para tal atuação profissional que penalizou três inocentes, ignorando suas denúncias de tortura, está expressa numa obtusa declaração dada aos jornais e é assustadora, sob vários aspectos. Segundo o Promotor de Justiça, a justificativa para não dar crédito à palavra dos réus seria  que "90% dos que confessam na polícia depois afirmam em Juízo que confessaram falsamente sob tortura".

Na verdade, obtusa não é a declaração em si, que deve até ser verdadeira, mas a conclusão que dela se pretende extrair, de que, portanto, as alegações de tortura não devem, via de regra, ser levadas a sério.

A conclusão correta e óbvia, ao menos para quem enxerga um palmo na frente do nariz e que, além disso, não tolera hipocrisia, é que a imensa maioria dessas confissões é mesmo obtida por tortura. Não por outro motivo, o Secretário dos Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo de Tarso Vanuchi, afirmou que “a tortura continua sendo prática rotineira, num patamar muito elevado” (“O Estado de São Paulo”, 4.9.2008, p. C5).

Ou alguém dotado de um pingo de bom senso realmente acredita que um sujeito, mesmo que tenha praticado um crime (de inocentes, então, nem se fala), confessaria espontaneamente na polícia só para depois negar perante o juiz? Seria a figura dos policiais tão mais inspiradora de bons sentimentos (compungidos, honestos) que a dos magistrados, perante quem os acusados não teriam qualquer pudor em mentir? Seria algum curso de psicologia do interrogatório ministrado nas academias de polícia a que os juízes não têm acesso? Teriam os policiais alguma nova tecnologia, uma espécie de "interrogator tabajara"? Algum soro da verdade, talvez?

Bem por isso, em sua obra primorosa, “O valor da confissão” (Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 2ª ed., 1999) Guilherme de Souza Nucci dedica um trecho especialmente à confissão feita no inquérito policial. De início, afirma, “não se pode iniciar a avaliação sem conhecer a razão de ser do inquérito policial e os notórios aspectos ligados à violência policial no curso das investigações do crime” (p. 187, grifos nossos).

E, mais adiante, o autor deixa claro que, “como procedimento preparatório e preventivo, não tem qualquer contorno judicial, sendo inválido para produzir provas, via de regra, contra o réu,” pois “estão longe do inquérito policial os princípios fundamentais da ampla defesa e do contraditório” (ob. cit., p. 189/190, grifos nossos).

E prossegue:

“Ressalte-se o disparate que ocorre, atualmente, nos julgamentos do Tribunal do Júri, quando provas produzidas na polícia, sem a menor confirmação em juízo, são exibidas com a maior naturalidade aos jurados, como se efetivas provas fossem, auxiliando sobremaneira na condenação dos réus. Afinal, juízes leigos que são, como discernir entre provas da polícia e provas do juízo? Se nebulosos ainda são os conceitos do contraditório e da ampla defesa para muitos juízes togados, logicamente, dos jurados não se poderia exigir pleno discernimento a esse respeito. Ao decidirem por livre convencimento imotivado, podem optar pela condenação exclusivamente por conta de uma prova __ às vezes até falsa __ produzida na fase extrajudicial. Essa não é a garantia que queremos para uma imparcial distribuição de justiça, de forma que deve o Judiciário fortalecer sua posição contrária à realização e aceitação desse tipo de prova” (ob. cit., p. 192/3, grifos nossos).

Não obstante tais lições, no caso concreto, os membros do Poder Judiciário e Ministério Público parecem ter preferido seguir o caminho descrito pelos Beatles na canção cujo trecho serve de epígrafe a este texto. E os “FAB Four”tinham absoluta razão: viver com os olhos fechados, entendendo errado tudo o que se vê realmente é fácil. Sem dúvida, mais fácil do que encarar a realidade e tentar mudá-la.

Afinal, responda você, caro leitor, em que mundo prefere viver: num onde a polícia tortura e forja confissões de acordo com suas próprias convicções ou naquele em que criminosos, embora capazes de estuprar e matar cruelmente, acabam tendo a honestidade de confessar aos seriíssimos e respeitadores policiais (ainda que depois estraguem tudo, ao inventarem essas histórias de tortura nos interrogatórios judiciais)?

Se você escolheu a segunda opção, talvez entenda por quê magistrados e promotor tenham feito a mesma escolha, fechando os olhos e entendendo errado o que viram. Tinham diante de si três jovens dizendo que assinaram confissões falsas sob tortura e viram três criminosos perigosos e mentirosos. Seria quase compreensível, não fosse a natureza de seus cargos, que não lhes permite fechar os olhos e escolher o mundo em que vão viver e as gravíssimas conseqüências de tal postura, para esses e muitos outros réus.

A única alternativa a esta hipótese de “cegueira voluntária” é bem pior e, por isso, impossível de se acreditar: teriam admitido a possibilidade de os réus terem sido torturados, mas, acreditando-os culpados, simplesmente não teriam se importado, quer por achar que os fins (obter a confissão) justificam os meios, quer por não achar de todo injusto que supostos criminosos confessos recebessem “um castiguinho a mais”, deliberadamente ignorando que o ordenamento jurídico não distingue se a vítima de tortura é ou não culpada de algum crime.

Como não se pode admitir tal alternativa, só se pode concluir que, realmente, ninguém quis enxergar o óbvio, que os rapazes foram torturados, tornando suas confissões imprestáveis (como, de resto, deveriam ser todas as confissões e provas policiais não-confirmadas em Juízo).

É verdade que há notícias a respeito de uma testemunha que teria ouvido os três rapazes conversarem entre si, supostamente sobre o crime, dizendo algo como “era só para ter dado um corretivo nela”.

Porém, dada a falta de divulgação de maiores detalhes, não se pode deixar de indagar se tal testemunha foi ouvida em Juízo, com todas as garantias do contraditório, esclarecendo, compromissada, exatamente em que circunstâncias teria presenciado tal declaração e, nesse caso, se já foram tomadas providências para apurar a possível ocorrência do crime de falso testemunho. Ou se, por outra, trata-se de testemunha apenas referida pelos policiais, ou ouvida só na fase inquisitorial, possivelmente sem identificação ou qualificação apropriadas. Infelizmente, não seria o primeiro caso desse tipo de que se tem notícia; mas, se for esse o caso, melhor seria nem mencionar essa “prova”, para não tornar ainda mais embaraçosa uma situação já delicada.

Por fim foi divulgada uma última “prova” que teria pesado contra os réus: uma testemunha, próxima ao local do crime, teria ouvido um barulho semelhante ao estouro de um escapamento com defeito, defeito este apresentado pelo carro de um dos réus. Haveria MUITO a dizer a respeito das fragilidades de tal circunstância como elemento probatório, mas não se fará isso aqui.

Primeiro, porque tais fragilidades são óbvias demais; mas principalmente porque esta não é uma peça de defesa dos réus, mas uma tentativa de descobrir onde e por quê o sistema falhou.

Portanto, só cabe dizer que quando se ignora a presunção de inocência, qualquer migalha que nada provaria se o ônus da prova fosse mantido com a acusação acaba servindo para confirmar a ilegalmente presumida culpa do acusado.

Só nos resta lutar para chegar o dia em que, ao invés de Strawberry Fields, possamos nos remeter a It’s a Wonderful World.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

“ANISTIA AMNÉSIA” AINDA PROTEGE TORTURADORES


 


A matéria abaixo, de Pedro Pomar,  foi publicada no Informativo ADUSP no. 351. Relata o ato-debate realizado na USP sobre os 33 anos da Lei de Anistia,  em 27 de agosto último, do qual participei.


 

“A primeira coisa aqui é desmentir esta história de que a Lei 6.683/1979, a lei de anistia parcial, foi resultado de um pacto forjado com a sociedade brasileira. Nada mais falso. O que caracteriza o projeto de distensão lenta gradual e segura do general Geisel e a abertura de Figueiredo é a imposição de um ‘consenso básico’ para a institucionalização dos princípios da ‘Revolução’ de 1964”. Assim a historiadora e ativista de direitos humanos Heloísa Greco abriu sua exposição no debate sobre os 33 anos da Anistia, realizado pelo Fórum Aberto pela Democratização da USP no auditório da História, em 27/8.

Daniel Garcia



Heloísa, Fon, Felippe, Fábio Franco (coordenou) e Angela

A anistia restrita e parcial, que preservou, impunes, os torturadores e assassinos que atuaram a serviço da Ditadura Militar (mas manteve nos cárceres os presos políticos acusados de “crimes de sangue”), teria resultado de uma negociação entre os blocos que participavam do poder, obtendo como contrapartida “o reforço da criminalização daqueles que estão de fora, da interdição do dissenso, da repressão às oposições não consentidas ou não domesticáveis”.

Nos planos do “consenso básico” de Geisel não figurava a anistia, a princípio: acenava-se, “no máximo, com uma possível revisão de punições caso a caso”, a qual “só passa a ser abordada de forma mais ostensiva a partir de 1978, exatamente quando a luta pela anistia ganha amplitude e força a Ditadura e o aparato midiático a colocarem a discussão em pauta”.

Neste momento, duas concepções se confrontam: uma, a da “anistia como resgate da memória e direito à verdade e à justiça: reparação histórica, luta contra o esquecimento, direito à justiça: anistia anamnese (memória instituinte)”; outra, a da “anistia como esquecimento e pacificação: conciliação nacional, consenso (certeza da impunidade), a anistia parcial e recíproca, defendida pela Ditadura: anistia amnésia (memória instituída, oficial), cuja matriz é a Doutrina de Segurança Nacional”. Prevaleceu, afinal, a “estratégia do esquecimento”.

Ditabranda?

Márcio Sotello Felipe, procurador do Estado e membro do Comitê Paulista Memória, Verdade e Justiça, destacou os números da repressão na Ditadura Militar, para desfazer o mito da “ditabranda”: 50 mil pessoas detidas por razões políticas já nos primeiros meses após o golpe; 20 mil torturadas ao longo do período ditatorial; cerca de 500 ativistas de oposição mortos ou desaparecidos; genocídio de nações indígenas; centenas de camponeses executados. Ele enfatizou a definição de que crimes contra a Humanidade são aqueles praticados pelo Estado, como no caso das torturas e execuções levadas a cabo por agentes dos órgãos de repressão.

“Quarenta pessoas ligadas à USP foram mortas ou estão desaparecidas, daí a importância de uma Comissão da Verdade na USP”, afirmou. Citou casos de vítimas da Ditadura que tinham relação com a Faculdade de Direito do Largo São Francisco, como Arno Preis (assassinado) e o professor Alberto Moniz da Rocha Barros, “que foi espancado na porta da faculdade e morreu alguns meses depois”, em decorrência das agressões.

Felippe criticou a decisão do Supremo Tribunal Federal, de 2010, de manter em vigência a Lei da Anistia, e particularmente o relator Eros Grau, que sustentou a tese de que a lei resultou de acordo político. “Ocorre que os subversivos a obtiveram, a anistia, à custa dessa amplitude [a imunidade dos torturadores]. Era ceder e sobreviver, ou não ceder e continuar a viver em angústia, em alguns casos nem mesmo viver [referência aos presos políticos que faziam greve de fome]”, afirma uma passagem do voto do relator, que Felippe considera absurda.

“O acordo nunca existiu na verdade. Mas digamos que tivesse existido. Ora, é trivial, elementar, saber que um acordo tem um pressuposto básico: a liberdade da vontade. Se não há liberdade da vontade, não há acordo. O próprio ministro está descrevendo um acordo juridicamente inexistente, impossível de ser considerado válido”, protestou o procurador. “Crimes contra a Humanidade não se anistiam e não prescrevem, e não há reconciliação nacional para isso. Não temos esse direito”, arrematou.

Revogação da lei

“A impunidade dos torturadores de ontem alimenta a impunidade dos torturadores de hoje”, assinalou a historiadora Angela Mendes de Almeida, pesquisadora do Observatório de Violências Policiais da PUC-SP. “Gostaria que a Lei da Anistia fosse reinterpretada ou revogada”, declarou ela, ex-presa política, a propósito da impunidade dos torturadores. Seu companheiro, jornalista Luiz Merlino, foi assassinado no DOI-CODI do II Exército.

Angela apontou a continuidade, no Brasil de hoje, da instituição da tortura por aparatos de Estado, em especial a Polícia Militar, cuja existência “é uma verdadeira excrescência”. Informou que a PM paulista mata em média 45 pessoas por mês; que em todos os batalhões existem grupos de extermínio, segundo revelação de um policial; e que o histórico de brutalidades levou o Conselho de Direitos Humanos da ONU a propor a extinção da PM. “É muito raro que um PM seja condenado por execução sumária”, disse.

Ela comentou recente polêmica entre os professores Paulo Arantes e Edson Teles, de um lado, e o governador Tarso Genro, de outro lado, a respeito da caracterização do atual regime político brasileiro. Arantes e Teles acreditam que vivemos um “estado de exceção permanente”, ao passo que Genro defende a hipótese de que o Brasil é um “estado democrático de direito, com democracia limitada”. Após relatar uma série recente de graves violações de direitos humanos — como a prisão e desaparecimento de 12 operários que trabalhavam na construção da Usina de Jirau (Pará) — Angela concluiu: “Se isso é estado democrático de direito, então a gente terá que rever essa ideia”. Criticou declarações do governador Alckmin (PSDB) de incentivo à morte de “bandidos” e elogiou a iniciativa corajosa de Matheus Magnani, procurador da República que pediu a substituição do comando da PM, por descontrole da tropa.

Sombra do quepe

Aton Fon, ex-preso político, advogado de alunos expulsos pela gestão Rodas, manifestou que houve disputa já no momento de elaboração da Lei da Anistia. Em 1974, além da derrota dos grupos que fizeram a luta armada, houve o extermínio da direção do Partido Comunista Brasileiro (PCB, que não havia aderido à luta armada contra a Ditadura), como preparação do processo de transição conservadora. O fim do “milagre econômico” obrigou os militares a pensarem em como se retirar da cena, para determinar de algum modo, por “trás da coxia, o que os atores vão fazer”. Surgiram confrontos internos no regime (com generais como Sílvio Frota), que retardaram os ajustes no governo, dando mais tempo às lutas populares pela anistia.

O movimento dos familiares das vítimas da Ditadura e seus apoiadores fez da questão dos desaparecidos políticos uma bandeira política. “Avançou-se na discussão sobre a tortura, obrigando o governo a dar explicações, construindo-se um arco de alianças que ia da Igreja católica à extrema-esquerda”. Num jogo Coríntians x Santos, no início de 1979, o desfraldar de uma faixa com os dizeres “Anistia ampla e irrestrita” mostrou aos militares, prosseguiu Fon, o perigo da popularização dessa bandeira, levando-os a acelerar seu projeto de anistia. “Eles tinham a força, saiu do jeito que eles queriam. Não conseguimos alterar a correlação de forças”, explicou.

“Infelizmente para nós, são 33 anos de um regime político inteiramente tutelado. Após a morte de Tancredo, foi o general Leônidas Pires que determinou a posse de Sarney. Em vários momentos, a gente percebe a sombra do quepe atrás da gente”. Sobre a Comissão Nacional da Verdade, ele lembra que a luta agora está na rua e nas instituições, residindo aí a possibilidade de avançar: “Estamos numa batalha para construir a contra-hegemonia”.

Quanto à polêmica entre Paulo Arantes e Tarso Genro, acredita Fon que ambos estão equivocados, embora considere estar mais próximo deste último, mas “ainda não derrotamos o poder limitador”.

(fonte: Informativo Adusp 351)

---------
Pedro Estevam da Rocha Pomar
















































sábado, 25 de agosto de 2012

O Travesti, o Advogado e Cazuza



  “Nas noites de frio é melhor nem nascer
Nas de calor, se escolhe: é matar ou morrer
E assim nos tornamos brasileiros
Te chamam de ladrão, de bicha, maconheiro
Transformam o país inteiro num puteiro
Pois assim se ganha mais dinheiro”


(Cazuza, O Tempo Não Para)



             pj                                            


 


   O rapaz viera de Minas fazer a vida em São Paulo. Dera-se razoavelmente bem. Comprara um opala usado, mas em boas condições. Uma madrugada apareceu morto no carro. Um tiro na cabeça.


   Na mesma noite a polícia prendeu o suspeito. Um travesti teria assassinado o rapaz no programa. Latrocínio.


   O jovem advogado nomeado pelo juiz entrevistou o réu antes do interrogatório. Ele negou. Negou para o juiz. Já havia negado para a polícia. Negou tudo o tempo todo. Firme e serenamente.


   O advogado impressionou-se com a fragilidade do inquérito. Não havia prova alguma. Ocorreu que a polícia recebera informação de um alcagueta. Amarrou  circunstâncias e indícios fracos dando a tudo a aparência de racionalidade investigativa.  O informante nunca apareceu. Claro, era dedo-duro. O delegado mandou para o forum. Deu certo. Denúncia por latrocínio.


   Crime pesado com acusação precária transformavam um jovem advogado em Perry Mason. A máquina do Estado, porém, tinha sua lógica vil. Crime pesado que saía em jornal sem solução era duro de engolir. Alguém pagava.


    O defensor entendeu o jogo jogado. Era simples: acreditar no alcagueta. A polícia acreditou e gostou muito de acreditar. Resolvia tudo. O Ministério Público acreditou. Faltava o juiz acreditar. Uma aposta. Se desse certo, missão cumprida. Se não desse, o sol nasceria do mesmo jeito no dia seguinte.


    "Não vai ser bem assim", pensou o advogado. Saiu do forum indignado e foi tomar um café expresso ali na rua XI de agosto, ao lado do Palácio da Justiça. Na época o forum criminal era lá.  Sorveu o expresso curto, forte e sem açucar entre murmúrios. “Filhos da puta esses caras pensam que nunca teve a porra do Iluminismo pensam que isso é processo inquisitório pensam que vivemos na porra da Idade Média pegar um travesti de programa marginal entre os marginais tão fácil meter o miserável na cadeia 30 anos quem condena é o alcagueta da polícia não precisa mais nada e todos os ilustres bacharéis delegados promotores juízes fazendo de conta que a coisa é séria que aprenderam tudo de Beccaria na Faculdade que o processo penal é civilizado e no final das contas estão apenas carimbando a palavra de um torpe alcagueta?”


   O processo correu como o advogado previa. Nada que prestasse. Depoimento dos policiais que prenderam o réu e de uma tia da vítima que nem morava aqui e apenas cuidou do funeral. A audiência constrangeu todos. Deu pena da pobre mulher ouvindo aquela história de como seu sobrinho havia sido assassinado em um programa com um travesti.


   O juiz acreditou no alcagueta. Como o delegado e o promotor. Fundamentação um pouco mais elaborada do que a da polícia, arrumando  melhor aqueles indícios e circunstâncias, mas tudo, afinal, resumia-se ao informante das sombras. Saiu uma pena pesada.


   O indignado defensor foi ao presídio conversar com o réu antes das razões do recurso. Tinha algumas coisas a esclarecer. Absolutamente convencido da inocência do cliente, preparava uma peça arrasadora e irrespondível.


   O travesti não era mais travesti. Havia retomado a aparência masculina. Convertera-se. Era então um “bíblia”. A conversa foi breve. O réu interrompeu bruscamente o advogado:


   - Eu dei o tiro na cara do rapaz, doutor. Meus dias eram 24 por 48 horas, doutor. Ele não quis pagar. Peguei umas coisas dele e saí correndo.


   “24 por 48…tiro na cara”.  Nunca tivera a menor dúvida de que ele fora o primeiro miserável que a polícia achou para livrar-se do latrocínio. O espírito de Perry Mason largou o seu corpo e voou sobre as ruas de Santana.


   Anos depois ouviu uma canção de Cazuza que dizia “meus dias são de par em par”. Cazuza usava linguagem mais poética, “par em par”. Semelhante ao que o  réu lhe dissera,  mas em linguagem mais cartesiana: “24 por 48”.  Drogas e remédios. Ao final das 48 horas,  o que era o que, quem era quem?


   Era assim que a polícia trabalhava. Apostava. Muita gente inocente ia para cadeia, mas de vez em quando a roleta parava no lugar certo.


   O ânimo era outro, mas advogados têm prazos. Foi para o escritório e avançou para depois da hora do expediente fazendo um extenso e fundamentado recurso. Como epígrafe uma citação de Kant: “o que é incompatível com o princípio da publicidade é incompatível com o princípio da moralidade”. Tecnicamente não tinha muito a ver, e nem esperava que apreciassem a sutil tirada filosófica: quem podia dizer qual, de verdade,  o fundamento  daquela condenação? Toda a sofisticada máquina do Estado movimentada por um vil alcagueta?



                                    * * * * * *



   Trinta anos depois daquele dia em Santana o advogado jantava com um amigo.


   - Você defende gente que sabe culpada. Como você consegue?


  O advogado ergueu a taça de vinho devagar e levou à boca pensando na resposta à pergunta desagradável. “24 por 48, doutor… tiro na cara". Articulou mentalmente a resposta.


  “Consigo porque é meu dever e esse dever está apoiado em um princípio superior.


  “Se culpados são condenados sem provas, pessoas inocentes também começarão a ser condenadas sem provas. A sociedade ganha mais deixando solto o réu culpado contra quem não há provas suficientes do que mandando para a cadeia inocentes. Por isso há o princípio da presunção de inocência.


  "Sociedades democráticas não são construídas sem princípios e princípios não podem ser respeitados somente quando convém.


   “Então, meu caro, ou o Estado prova ou o Estado solta. Não pode condenar pela mera convicção subjetiva de delegados, promotores ou juízes, ou por uma aposta deles na alta probabilidade de o acusado ser mesmo culpado. Já os flagrei fazendo isso e sabia que o réu havia cometido um crime horroroso. Mas era só uma aposta do Estado. Aposta certa, mas aposta,  e irresponsável. Ouvi a confissão do réu e a esqueci quando atravessei o portão do presídio.”

   Isso tudo ele pensou. Depois balançou a cabeça num gesto de desânimo, como quem diz "deixa pra lá", e respondeu, pousando a taça na mesa:


   - Nunca tive um réu que soubesse ser culpado.


--------


- A história é verídica. Alguns detalhes foram modificados 



























quinta-feira, 9 de agosto de 2012

NOAM CHOMSKY: NA SOMBRA DE HIROSHIMA


 

Por Noam Chomsky, publicado por Esquerda.net

O 6 de agosto, aniversário de Hiroshima, deveria ser um dia de reflexão sombria, não só pelos terríveis acontecimentos dessa data em 1945, mas também pelo que revelaram: que os seres humanos, na sua busca dedicada de meios para aumentar a sua capacidade de destruição, finalmente tinham conseguido encontrar uma forma de aproximar-se do limite final.



Os atos em memória desse dia têm, este ano, um significado especial. Têm lugar pouco antes do 50º aniversário do momento mais perigoso na história humana, nas palavras de Arthur M. Schlesinger Jr, historiador e assessor de John F. Kennedy, ao referir-se à crise dos mísseis cubanos.

Graham Allison escreve na edição atual de “Foreign Affairs” que Kennedy ordenou ações que sabia que aumentariam o risco não só de uma guerra convencional, mas também de um confronto nuclear, com uma probabilidade que ele calculou em cerca de 50%, cálculo que Allison considera realista.

Kennedy declarou um alerta nuclear de alto nível que autorizava aviões da Otan, tripulados por pilotos turcos (ou de outro país), a descolar, voar para Moscou e deixar cair uma bomba.

Ninguém ficou mais surpreendido pela descoberta dos mísseis em Cuba que os homens encarregados de mísseis semelhantes que os Estados Unidos tinham colocado clandestinamente em Okinawa seis meses antes, seguramente apontados à China, em momentos de crescente tensão.

Kennedy levou o presidente soviético Nikita Krushov até mesmo à beira da guerra nuclear e ele assomou-se da beira e não teve estômago para isso, segundo o general David Burchinal, então alto oficial de planeamento do Pentágono. Ninguém pode contar sempre com tal prudência.

Krushov aceitou uma fórmula proposta por Kennedy, pondo fim à crise que estava à beira de se converter em guerra. O elemento mais audaz da fórmula, escreve Allison, era uma concessão secreta que prometia a retirada dos mísseis norte-americanos da Turquia no prazo de seis meses, depois da crise ter sido evitada. Tratava-se de mísseis obsoletos que estavam sendo substituídos por submarinos Polaris, muito mais letais.

Em resumo, mesmo correndo o elevado risco de uma guerra de inimaginável destruição, considerou-se necessário reforçar o princípio de que os Estados Unidos têm o direito unilateral de colocar mísseis nucleares em qualquer parte, alguns apontando à China ou às fronteiras da Rússia, que previamente não tinha colocado mísseis fora da URSS. Deram-se justificativas, certamente, mas não creio que aguentem uma análise.

Juntamente com isto estava o princípio de que Cuba não tinha o direito de possuir mísseis para a sua defesa contra o que parecia ser uma invasão iminente dos Estados Unidos. Os planos para os programas terroristas de Kennedy, Operação mangoose (mangusto), estabeleciam uma revolta aberta e o derrube do regime comunista em outubro de 1962, mês da crise dos mísseis, com o reconhecimento de que o êxito final requereria uma intervenção decisiva dos Estados Unidos.

As operações terroristas contra Cuba são habitualmente descartadas pelos comentadores como manobras insignificantes da CIA. As vítimas, como é de supor, veem as coisas de uma forma muito diferente. Pelo menos podemos ouvir as suas palavras em “Vozes do outro lado: Uma história oral do terrorismo contra Cuba”, de Keith Bolender.

Os acontecimentos de outubro de 1962 são amplamente elogiados como o melhor momento de Kennedy. Allison considera-os como um guia sobre como diminuir perigo aos conflitos, gerir as relações das grandes potências e tomar decisões acertadas acerca da política externa em geral. Em particular, aos atuais com o Irã e a China.

O desastre esteve perigosamente próximo em 1962 e não houve escassez de graves riscos desde então. Em 1973, nos últimos dias da guerra árabe-israelita, Henry Kissinger lançou um alerta nuclear de alto nível. Índia e Paquistão estiveram muito perto de um conflito atômico. Houve inumeráveis casos em que a intervenção humana abortou um ataque nuclear momentos antes do lançamento de informações falsas de sistemas automatizados. Há muito em que pensar sobre o 6 de agosto.

Allison junta-se a muitos outros ao considerar que os programas nucleares do Irã são a crise atual mais grave, um desafio ainda mais complexo para os decisores políticos dos Estados Unidos do que a crise dos mísseis cubanos, devido à ameaça de um bombardeamento israelita.

A guerra contra o Irã está já em andamento, incluindo o assassinato de cientistas e pressões econômicas que chegaram ao nível da guerra não declarada, segundo o critério de Gary Sick, especialista em Irã.

Há um grande orgulho sobre a sofisticada ciberguerra dirigida contra o Irã. O Pentágono considera a ciberguerra como ato de guerra, que autoriza o alvo a responder mediante o uso da força militar tradicional, informa o The Wall Street Journal. Com a exceção habitual: não quando os Estados Unidos ou um seu aliado é quem o leva a cabo.

A ameaça iraniana foi definida pelo general Giora Eiland, um dos maiores responsável pela planificação militar de Israel, “um dos pensadores mais engenhosos e prolíficos que [as forças militares israelitas] produziram”.

Das ameaças que define, a mais crível é que qualquer confronto nas nossas fronteiras terá lugar sob um guarda-chuva nuclear iraniano. Em consequência, Israel poderia ver-se obrigado a recorrer à força. Eiland está de acordo com o Pentágono e com os serviços de segurança dos Estados Unidos, que consideram a dissuasão como a maior ameaça que o Irã coloca.

A atual escalada da guerra contra o Irã aumenta a ameaça de uma guerra acidental em grande escala. Alguns perigos foram ilustrados no mês passado, quando um barco norte-americano, pertencente à enorme força militar estacionada no Golfo, disparou contra um pequeno navio de pesca, matando um membro da tripulação indiana e ferindo outros três. Não se necessitaria muito para iniciar outra guerra importante.

Uma forma sensata de evitar as temidas consequências é procurar a meta de estabelecer no Oriente Médio uma zona livre de armas de destruição massiva e de todos os mísseis necessários para o seu lançamento, e o objetivo de uma proibição global sobre armas químicas – que é o texto da resolução 689 de abril de 1991 do Conselho de Segurança, que os Estados Unidos e a Grã-Bretanha invocaram no seu esforço para criar uma tênue cobertura para a sua invasão do Iraque, 12 anos depois.

Esta meta foi um objetivo árabe-iraniano desde 1974 e por estes dias tem um apoio global quase unânime, pelo menos formalmente. Uma conferência internacional para debater formas de levar a cabo um tal tratado pode ter lugar em dezembro.

É improvável o progresso, a menos que haja um apoio massivo no Ocidente. Ao não se compreender a importância desta oportunidade alargar-se-á uma vez mais a fúnebre sombra que obscureceu o mundo desde aquele terrível 6 de agosto.

Artigo de Noam Chomsky, publicado no jornal mexicano La Jornada. Tradução de Carlos Santos para Esquerda.net
















































domingo, 29 de julho de 2012

A Mistificação da Grande Mídia

 

                                              faust2

Na edição de 1o. de agosto a Carta Capital publicou uma matéria bombástica.

Tratou do chamado “mensalão mineiro”. Consta que Gilmar Mendes (entre outros próceres da República) teria recebido alguns milhares de reais em 1998 em um esquema mais uma vez organizado por Marcos Valério

Há indícios razoáveis para uma investigação.

Gilmar Mendes vai julgar o “mensalão”, que envolve o mesmíssimo Marcos Valério. Neste momento a situação ultrapassa perigosamente os limites do surrealismo, ou, talvez, do realismo fantástico que a literatura latino-americana criou para falar adequadamente deste continente insano do hemisfério sul.

O que causa, no entanto, a mais profunda repulsa (ou asco. Ou nojo) é o comportamento da assim chamada “grande imprensa”, que cada vez mais faz jus à alcunha PIG. A Folha de São Paulo ignora a matéria da Carta Capital. Sua manchete de hoje, sábado, 28 de julho, porém, explora de forma sensacionalista uma peça  do procurador-geral de República encartada no processo do “mensalão”:  “Mensalão foi o mais atrevido ‘esquema’, afirma Procurador”. Mas não informa que um dos ministros que irá julgar o caso pode ter recebido dinheiro ilicitamente do réu que vai julgar, Marcos Valério, o que circulava na internet desde a noite de quinta-feira

O mundo de Alice no País das Maravilhas é uma pálida cópia do Brasil hoje.

Reparem que quando o PIG se refere aos blogs progressistas, hoje praticamente a única fonte de informação isenta e honesta de que dispõe a sociedade, invariavelmente usa a expressão “militantes”, ou “militantes petistas” das redes sociais. Nunca são veículos legítimos de expressão, nunca são parte da imprensa. São desprezíveis “militantes”. Claro que as famílias Genovese, Bonanno, Gambino, Lucchese e Colombo, etc. (ops, Civita, Marinho, Frias, etc.) não têm qualquer interesse político-partidário. Só os outros é que são “militantes”. Eles não são militantes de coisa alguma, embora até as pedras das ruas saibam quais partidos e candidatos eles apoiam e saibam que usam, sem pudor,  seus veículos  para tentar elegê-los.

O partido notoriamente beneficiado pela grande imprensa acaba de entrar com uma representação contra os blogs de Nassif e Paulo Henrique Amorim. A tese é que tais blogs recebem patrocínios de verbas públicas para apoiar o governo. Eu, como cidadão, quero então saber qual o volume do dinheiro que a grande imprensa recebe dos orçamentos públicos para desinformar a sociedade, defender seus interesses empresariais e apoiar partidos e candidatos.

Chamar esses senhores da grande imprensa de militantes é uma demasia. São militontos. Imaginam que nada disso terá consequências, que não está ficando cada vez mais nítido para a parte lúcida da sociedade o papel ignóbil que eles desempenham e que, afinal de contas, vai ficar por isso mesmo.

Sempre chega o dia do acerto de contas. Quem deve para o diabo sempre paga. Esse pacto nunca foi um bom negócio.